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terça-feira, 9 de julho de 2019

Nas redes sociais “ninguém está interessado em saber o que exatamente é verdade”

Foto de Adérito CaldeiraO experiente jornalista Nicolau Santos afirmou em Maputo que “o que acontece nas redes sociais é que ninguém está interessado em saber o que exatamente é verdade mas está interessado em saber se aquilo em que acredita está lá”. O agora PCA da agência de notícias Lusa alertou: “os órgãos de comunicação social que supostamente tem uma agenda própria para cobrir determinados acontecimentos passaram a seguir a agenda das redes sociais (...) isto é a inversão completa do que deve ser o jornalismo”.

A segunda Conferência de “Combate às Fake News”, organizada pela agência Lusa, trouxe à capital moçambicana um dos mais eminentes jornalistas portugueses, Nicolau Santos, que nesta terça-feira (09) fez um retrato da crise que o jornalismo no mundo enfrenta e que, na sua óptica, é caracterizada pela quebra de audiências, pela crise financeira das empresas de comunicação social, mas não só.

“Para duas ou três gerações o que está nas redes sociais é a informação suficiente que as pessoas necessitam, não precisam de ir aos meios tradicionais a procura do jornalismo que é feito de acordo com as regras deontológicas. Portanto basta saber que o meu amigo está bem e que foi tomar banho a uma praia qualquer paradisíaca e comer num belo restaurante para duas ou três gerações isso passou a ser a informação necessária suficiente. Eventualmente há grupos com interesses muito focados e essa informação é que lhes basta, não querem saber de outro tipo de informação”, constatou o jornalista.

Nicolau Santos anotou ainda que “multiplicaram-se os produtores de informação, toda a gente com um telemóvel passou a produzir informação, toda acha portanto que toda informação que tem chega e sobra e já não tem tempo sequer para consultar, cerca de 65 por cento da população mundial, ou seja 4,2 biliões de pessoas, já se informam apenas nas redes sociais, podem chegar aos meios tradicionais através das redes sociais mas o que é certo é que procuram nas redes sociais aquilo que querem, já não vão sequer a um órgão tradicional que seja reconhecido” e que “este caos informativo leva a que muitas gente considere que o que se escreve nas redes sociais é jornalismo”.

Santos, que agora preside ao Conselho de Administração agência de notícia portuguesa Lusa, enfatizou “o que se passa nas redes sociais não é jornalismo, é outra coisa completamente diferente”. No jornalismo desde 1980 o agora gestor notou a forma auto destrutiva como responderam as rádios, jornais e televisões, “passaram a disponibilizar informação sobre todos os suportes tentando de algum modo interessar precisamente pessoas que não liam a informação dos chamados meios tradicionais.”

“Os órgãos de comunicação social que supostamente tem uma agenda própria para cobrir determinados acontecimentos passaram a seguir a agenda das redes sociais”

“A velocidade de informação aumentou brutalmente e isso condiciona o trabalho dos jornalistas, porque hoje a necessidade de colocar na linha virtual dos sites rapidamente uma informação a que se tem acesso e que vai ser conhecida por outros meios de comunicação social leva a que por vezes se estejam a cometer erros graves, que não haja tempo de reflexão, não haja tempo de investigar profundamente a informação, há coisas que aparecem e que levam a que os jornalistas tomem como adquirido que é assim sem checkar essa informação. O que acontece por vezes nas redes sociais é que uma notícia que apareceu há 2 anos volta a reaparecer 2 anos depois e alguém que não leu a notícia 2 anos antes toma como verdadeira e volta a publica-la”, retratou Santos.

O PCA da Lusa alertou que agora: “nas redacções se passou a olhar para o que está a dar nas redes sociais. E os órgãos de comunicação social que supostamente tem uma agenda própria para cobrir determinados acontecimentos passaram a seguir a agenda das redes sociais, passaram a ir fazer o que fazem as redes sociais em termos de informação, isto é a inversão completa do que deve ser o jornalismo”.

Nicolau Santos foi categórico ao reafirmar: “a informação das redes sociais não é produzida de acordo com as regras deontológicas do jornalismo, não é fiável, não é confiável e o seu poder de multiplicação é enorme”, tendo destacado dois tipos fake news que se propagam duas vezes mais depressa do que as outras “é a desinformação política e a desinformação sobre questões de saúde.”

“O que acontece nas redes sociais é que ninguém está interessado em saber o que exactamente é verdade mas está interessado em saber se aquilo em que acredita está lá, as pessoas vão lá com o pressuposto que aquilo que vou encontrar é aquilo em que acredito, aquilo que sabem que é a verdade delas e portanto não lhes interessa outro tipo de verdade”, concluiu o experiente jornalista.



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