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quinta-feira, 9 de janeiro de 2020

Moçambique existe há 130 anos

Institut Cartogràfic i Geològic de CatalunyaNeste sábado (11) o nosso país deveria celebrar 130 anos desde que as suas fronteiras foram traçadas: “A linha contorcida de Moçambique moderno, fechada num abraço com os antigos territórios da África Central Britânica, não representa qualquer consequência racional da necessidade de um estado moderno, mas imortaliza o momento do dia 11 de Janeiro de 1890, em que a música cessou e os missionários, aventureiros, cônsules, pesquisadores de concessões, caçadores brancos e de toda a ralé das “partes interessadas” ficaram imobilizados em posturas que um tratado internacional não tardaria a tornar inalteráveis”.

Compulsando a história ensinada nas escolas, primária e secundaria, o nosso país foi delimitado na Conferencia de Berlim, em Fevereiro de 1885. Nas efemérides oficiais Moçambique nasceu apenas a 25 de Junho de 1975. No entanto a Cidade de Maputo celebrou no ano passado 132 anos, Beira 112 anos, Nampula 63 anos e a Ilha de Moçambique celebrou 201 anos!

O @Verdade apurou que: “A linha contorcida de Moçambique moderno, fechada num abraço com os antigos territórios da África Central Britânica, não representa qualquer consequência racional da necessidade de um estado moderno, mas imortaliza o momento do dia 11 de Janeiro de 1890, em que a música cessou e os missionários, aventureiros, cônsules, pesquisadores de concessões, caçadores brancos e de toda a ralé das “partes interessadas” ficaram imobilizados em posturas que um tratado internacional não tardaria a tornar inalteráveis”.

“Se o estado de Moçambique surgido das posteriores incluía as antigas cidades do Litoral e o Zambeze que fora português ou estivera sob influencia portuguesa desde o século XVI, as suas fronteiras internas reflectiam as actividades mais recentes dos aventureiros e caçadores de concessões. Os acontecimentos mais decisivos dos cinco anos anteriores tinham sido a celebração com o êxito do Tratado de Augusto Cardoso a leste do lago Malawi, em 1885, e dos Tratados de Buchanan e Johnston celebrados a ocidente e sul em 1889, o fracasso de Andrada e Sousa na ocupação do norte do território dos Machonas quando o seu exército irregular foi derrotado em Mtoko, em 1887, e o êxito dos aventureiros portugueses por oposição aos britânicos na conquista da sensibilidade e de parte da confiança de Gungunhana durante os cinco primeiros anos do seu reinado. O traçado final das fronteiras, porém, iria apresentar-se repleto de dificuldades, e, numa determinada fase, em meados da década de 1890, pareceu que a música iria recomeçar a reactivar-se o corropio de aventureiros e caçadores de concessões”, conta o historiador inglês Malyn Newitt no seu livro “História de Moçambique”.

Portugal tentou criar sector entre Angola e Moçambique que fosse administrado conjuntamente com a Grã-Bretanha

Newitt relata que: “A reacção portuguesa imediata ao ultimato foi procurar o apoio de outras potências europeias para um processo de arbitragem, invocando o Artigo 12º do Tratado do Congresso de Berlim. Lord Salisbury recusou desde logo qualquer concordância, lembrando sem dúvida o resultado da arbitragem da baía de Delagoa que achara favorável a Portugal, mas a discussão do assunto atrasou as negociações sobre a fronteira até Abril, altura em que se entabularam conversações bilaterais em Lisboa. Tendo falhado a obtenção de arbitragem, Portugal tentou manter vivas as suas aspirações a um prolongamento contínuo do território através de África e propôs em Maio a criação de sector entre Angola e Moçambique que fosse administrado conjuntamente pela Grã-Bretanha e por Portugal.”

“É importante a política destas propostas. A sobrevivência do governo português e de todo o regime monárquico tinha sido ameaçada pelo ultimato. O governo não estava em posição de estabelecer compromissos, muito embora soubesse que não conseguiria fazer frente a uma potencia como a Grã-Bretanha, que resolvera gerar polémica com a demarcação das fronteiras da África Central. Por conseguinte os Portugueses avançaram propostas que sabiam irem ser recusadas e aguardavam que lhes fosse imposta a solução da Grã-Bretanha. O governo britânico encontrava-se sob pressão da British South African Company, de Rhodes, que se preparava para ocupar o território que lhe fora concedido por decreto e estava ansioso por que, se possível, nenhuma zona da alta savana a sul do Zambeze viesse para Portugal”, explica o historiador que escreveu mais de 20 livros sobre Portugal e as colónias africanas.

“Portugal pouco mais era do um estado-cliente da Grã-Bretanha”

Institut Cartogràfic i Geològic de CatalunyaMalyn Newitt refere que: “A 20 de Agosto de 1890, foi assinado um tratado que concedia à Grã-Bretanha as Terras Altas do Shire e a alta savana do território dos Machonas, muito embora deixasse as terras altas de Manica na esfera de Portugal. Zumbo foi reconhecido como o ponto mais ocidental da influencia portuguesa no Zambeze; para lá dele ficaria a faixa de território britânico, apesar de Portugal ter direitos especiais numa faixa ao longo da margem norte do rio onde poderia construir estradas e caminho-de-ferro e erguer linhas de telégrafo. O tratado estava mais preocupado com a liberdade de comércio e direitos de trânsito, que havia provocado tensões diplomáticas na década de 1880, e Portugal preferiu não alienar qualquer parte do seu território a um terceiro país sem o consentimento da Grã-Bretanha. Por último, Portugal deveria arrendar território à Grã-Bretanha em Chinde, na foz do Zambeze, para a construção de um porto, e concordou em criar um linha férrea desde a foz do Púnguè até ao território sob protecção. O tratado ameaçava arrancar de um modo grosseiro a parra que cobria o facto embaraçoso de que Portugal pouco mais era do um estado-cliente da Grã-Bretanha.”

“Nos oito meses subsequentes ao ultimato tinham-se verificado idas e vindas extraordinárias na África Ocidental. Muito embora Salisbury exigisse que os portugueses se abstivessem de actividade nas zonas sujeitas a negociação, ninguém impediu Rhodes e os seus agentes de levarem por diante as suas actividades. Alfred Sharpe percorreu o Luangwa mas encontrou toda a região sob o chicunda português e uma bandeira portuguesa hasteada no território dos Mpezenis. Em Junho, a “Coluna Pioneira” de Rhodes entrou no território dos Machonas e Colquhoun e Jameson foram enviados respectivamente para celebrar tratados em Manica e estudar um percurso até a costa. Encontraram em todos os pontos das terras altas de Manica vestígios da presença e actividade de pesquisadores ou funcionários ao serviço da Companhia de Moçambique. Em Junho, os portugueses criaram uma guarnição na junção do Kafue e do Zambeze, e em Agosto partiu uma expedição à região da Lunda. Porém, as tentativas portuguesas de estenderem o seu sistema de tratados para leste do lago Malawi caíram por terra quando Valadim e a sua expedição se malograram às mãos do chefe Mataka. Entretanto, Buchanan reforçou a soberania britânica nas Terras Altas do Shire através do método improvisado de execução de dois cipais portugueses. Na foz do Chinde, canhoneiras portuguesas incapazes de navegar devido a sabotagem dos motores, tentaram enfrentar um navio topográfico britânico, que respondeu disparando os seus canhões. Durante o que foi, na verdade, uma suspensão do direito internacional, os “homens no local” entretiveram-se a posicionar-se e aproximar-se cada vez mais de acções que poderiam ter provocado um incidente grave”, narra o historiador inglês.

Cecil Rhodes tenta garantir o máximo território possível para a Chartered Company e criar um corredor até ao mar

O professor na universidade King's College de assuntos portugueses e africanos conta ainda que: “Em Setembro, a questão começou a tornar-se mais séria. O governo português, incapaz de obter a aceitação de um tratado nas Cortes, demitiu-se a 16 de Setembro, o Almirantado ordenou que uma canhoneira britânica subisse o Zambeze e chegaram notícias de um acto de pirataria por parte de Cecil Rhodes. A 15 de Setembro, alguns dos soldados de Rhodes prenderam Andrada e Manuel António de Sousa na capital de Mutasa e passaram a ocupar Mesekesa. Rhodes tencionava aproveitar-se do hiato diplomático e da rejeição, por parte de Portugal, do tratado de partilha para garantir o máximo território possível para a Chartered Company e, se viável, criar um corredor até ao mar. A possessão em África, reflectiu ele, eram nove-décimos da lei, e previa que Salisbury, que antes fora instigado e espicaçado eficazmente por Buchanan e Johnston na zona do Shire, se revelasse igualmente instigável em Manica.”

“Todavia, os “homens no local” tinham sido demasiado lentos. A 14 de Novembro, Portugal e a Grã-Bretanha assinaram um acordo provisório (um modus vivendi) que vigoraria durante seis meses, aceitando os limites territoriais do tratado de Agosto, até uma resolução definitiva da fronteira. A Chartered Company resolveu ficar no mesmo sitio e recusou-se a evacuar o território “português”, e as duas tropas ocupavam ainda Masekesa em Dezembro”, pode-se ler no livro que é uma raridade em Moçambique.

Malyn Newitt descreve que: “Durante o principio de 1891, os portugueses tentaram reunir uma expedição para enviar a Manica, enquanto Rhodes mandava um grupo armado ao Púnguè para abrir uma estrada do mar até a alta savana. Quase todos os dias se registava alguma confrontação entre o pessoal da Chartered Company e os Portugueses, e a Companhia exigiu então alto e bom som uma intervenção do governo britânico para vingar os insultos à bandeira. O incidente mais grave deu-se em Maio de 1891, quando tropas portuguesas e da Chartered Company se envolveram em Masekesa. Após um pequeno recontro, os soldados da Companhia perseguiram os portugueses em debandada até à costa. A 29 de Maio, parecia iminente um segundo combate quando um emissário do Alto-Comissário Britânico na África do Sul ordenou inequivocamente às forças da Chartered Company que se retirassem.”

Nova fronteira incluiu reino de Gungunhana na esfera portuguesa

Institut Cartogràfic i Geològic de Catalunya“A 28 de Maio de 1891, a Grã-Bretanha e Portugal acabaram por assinar um tratado que vinha de alguma forma alterar os termos aceites no ano anterior. Os acontecimentos em Manica tinham-se reflectido numa nova fronteira que acompanhava a linha da escarpa e deixava a capital de Mutasa do lado britânico da linha e Masekesa do lado português. A demarcação inicial do Shire e região do lago não foi alterada, mas Portugal tinha motivos para estar satisfeito, pois o reino de Gungunhana era reconhecido finalmente como pertencente à esfera portuguesa, enquanto os extensos territórios a norte do Zambeze, há muito ocupados pelos chicundas portugueses, eram também incluídos em Moçambique. Através de uma cláusula secreta do tratado, a pedido de Portugal, a Alemanha era nomeada a potencia que arbitrária quaisquer desinteligências. A satisfação derradeira para Portugal terá sido a ira de Rhodes ante uma delimitaçãoo que realmente tirava o tapete de baixo da sua guerra de corso territorial”, expõe o livro “História de Moçambique”.

Malyn Newitt conclui o capítulo do livro, sobre a delimitação das fronteiras, que até hoje conhecemos no nosso país, narrando: “Assim, Moçambique emergia finalmente das propostas e contra-propostas avulsas, das reivindicações sonoras de aventureiros e do emaranhado de mapas, Cor-de Rosa ou outros. Sem dúvida as suas fronteiras refrectiram em certa medida a evolução histórica da região. Os antigos portos marítimos de Ibo e Quissanga a norte de Inhambane e Lourenço Marques, no sul, tinham sido incluídos no novo estado com grande parte do comercio interior de que dependiam. Contudo, a baía de Delagoa ficou muito desligada do seu interior e manteve-se isolada e quase um enclave no Estado Sul-Africano que despontava. No Zambeze, os antigos territórios dos prazos foram incluídos em território português, tal como o interior de Sena no Barué e Manica. Tete e Zumbo viram o seu interior setentrional incluído, mas a zona a sul limitada aos braços inferiores dos rios Mazoe e Ruenha. As regiões a oeste de Zumbo perderam-se. A forma final do país apresenta três saliências – Tete e Zumbo, rodeados em três lados pelo território britânico, a saliência britânica nas Terras Altas do Shire rodeada por terra lusa; e a saliência que engloba o porto de Lourenço Marques, avançando para sul no território sul-africano. Moçambique estava encravado na África Central e do Sul Britânica, qual peça de um quebra-cabeças –peça essa que ostentava cada vez mais a imagem do empreendimento financeiro e do interesse imperial britânicos.”



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