O Governo de Filipe Jacinto Nyusi anunciou nesta segunda-feira(16) que a República de Moçambique vai tornar-se oficialmente num Estado caloteiro, não honrando o pagamento que havia renegociado há cerca de um ano com credores que detém Títulos do empréstimo da Empresa Moçambicana de Atum(EMATUM) SA. O impacto deste incumprimento para o povo moçambicano, a curto prazo, poderá não ser muito visível ou severo. “Na verdade, será menos pesado do que seria se o Governo aceitasse pagar a prestação agora em incumprimento”, explicou ao @Verdade o professor de economia António Francisco. A verdade é que, se porventura existe um decisão que nos manteria firmes e unidos, seria a renuncia do Chefe de Estado as Garantias Soberanas dadas pelo Governo de Armando Guebuza aos bancos suíço e russo.
“O Ministério da Economia e Finanças (o “Ministério”) da República de Moçambique (a “República”) vem por esta via informar aos detentores dos U.S.$726.524.000, 10.5 por cento de Títulos amortizáveis em 2023, emitidos pela República (as “Notas”) que o pagamento da prestação dos juros dos Títulos no montante global de U.S.$59.756.599, devidos a 18 de Janeiro de 2017, não será feito pela República de Moçambique”, indica um comunicado de imprensa tornado público nesta segunda-feira(16) onde é referido que este incumprimento era previsível desde Outubro de 2016, altura em que o Executivo de Nyusi reconheceu que a Dívida Pública moçambicana é insustentável pois vai ultrapassar os 100% do Produto Interno Bruto este ano.
Esta prestação que o Executivo de Nyusi não vai pagar, por falta de vontade ou por má-fé, já diz respeito a reestruturação da dívida que aconteceu em Abril de 2015 após ter ficado evidente que a empresa estatal não tinha viabilidade e nem sequer estava a usar os barcos de pesca, e as lanchas de patrulha, que supostamente adquiriu através de empréstimos secretos que totalizaram 850 milhões de dólares norte-americanos, contraídos em Setembro de 2013 junto dos bancos Credit Suisse e VTB Capital, violando a Lei Orçamental e a Constituição da República de Moçambique.
Em 2013 os investidores, grande parte europeus e norte-americanos, foram aliciados pelos bancos suíço e russo, com a possibilidade rendimentos lucrativos e seguros, afinal os empréstimos tinham Garantias Soberanas do Estado, na altura comandado por Armando Emílio Guebuza, com taxas de juros de 6,305%, mas que podiam gerar retorno de até 8,5%.
Todavia o Credit Suisse, o VTB Capital, assim como a EMATUM não informaram aos investidores que antes do empréstimo que estavam a colocar no mercado haviam negociado um outro no valor de 622 milhões de dólares norte-americanos, em Fevereiro de 2013, com outra empresa estatal moçambicana, a Proindicus SA, também com Garantia Soberana do Estado.
Adicionalmente, em Maio de 2014, outro empréstimo de 535 milhões de dólares norte-americanos foi negociado pelo mesmo grupo de moçambicanos e o banco russo, com Garantia do Estado, para a empresa Mozambique Asset Management(MAM).
Calote não é da EMATUM porque Filipe Nyusi assumiu o empréstimo como Dívida Pública
Quando a 11 de Março de 2015 venceu a primeira prestação dos Títulos emitidos pela EMATUM, a empresa revelou a incapacidade de honrar com os compromissos que tinha assumido. O Governo, entretanto já liderado por Filipe Nyusi, no lugar de renunciar a mesma, afinal eram evidentes as ilegalidades e inconstitucionalidades dos mesmo, ajudou a Empresa Moçambicana de Atum a pagar, primeiro os juros da primeira prestação, 26.796.250 dólares, e depois, a 11 de Setembro do mesmo ano, pagou a segunda prestação no montante de 103.296.250 dólares com fundos do Orçamento do Estado.
Seguidamente, no início de 2016, o Executivo de Filipe Nyusi, que tal como o seu antecessor manteve em segredo dos empréstimos ilegais da Proindicus e da MAM, assumiu como Dívida Pública o empréstimo ilegal e negociou com o detentores dos Títulos da EMATUM uma reestruturação: em vez de amortizar a dívida pagaria apenas os juros, que melhorou para 10,5%, em duas prestações anuais de 78 milhões de dólares, até 2023 altura em que pagaria na totalidade os 726,5 milhões de dólares que faltam pagar.
Entretanto a imprensa tornou pública a existência dos empréstimos adicionais da Proindicus e da MAM, que também violaram a Lei Orçamental e a Constituição da República, e a crise estalou afinal, para além de enganar aos investidores dos Títulos da EMATUM, os Governos de Armando Guebuza e de Filipe Nyusi também não informaram ao Fundo Monetário Internacional(FMI), nem ao povo moçambicano, que haviam endividado Moçambique em mais de 2 biliões de dólares norte-americanos.
Em Maio de 2016 venceu a primeira da Mozambique Asset Management no montante de 178 milhões de dólares norte-americanos. Até hoje essa prestação não foi paga e, oficialmente, a empresa estatal estará a negociar com os seus credores que ainda não accionaram a Garantia Soberana emitida pelo Governo de Guebuza e assumida por Nyusi.
Aliás o actual Presidente de Moçambique, ao contrário do que deixa transparecer, estaria a par de todos os empréstimos pois a Proindicus, a “mãe” de todas as dívidas, é uma empresa participada pelo Ministério Defesa que à data era liderado por Filipe Jacinto Nyusi, quiçá por isso em Junho do ano passado o seu Executivo avançou para a legalização do empréstimo da EMATUM incluindo-a na Conta Geral do Estado de 2014, que foi entretanto aprovada na Assembleia de República pelo voto maioritário da bancada do seu partido, Frelimo.
Desde que o Governo assumiu a insustentabilidade da Dívida Pública os detentores dos Títulos, que eram da EMATUM e agora são de Moçambique, embora se tenham organizado para negociar com o Executivo deixaram claro que aguardam os resultados da Auditoria Internacional que está a ser feita por imposição do FMI para tomarem uma posição activa.
Paralelamente decorrem investigações dos reguladores financeiros do Reino Unido, da Suíça e dos Estados Unidos da América para averiguar eventuais contornos fraudulentos no processo de emissão destes Títulos.
“Implicação imediata é o agravamento da já bastante má reputação de Moçambique”
Questionado pelo @Verdade o Professor de Economia na Universidade Eduardo Mondlane, António Francisco, explicou que este calote, a curto prazo, poderá não ter um impacto muito visível ou severo. “Na verdade, será menos pesado do que seria se o Governo aceitasse pagar a prestação agora em incumprimento, recorrendo às reservas disponíveis ou substituindo certas despesas. Moçambique tem reservas para pagar o valor em causa. Podia pagar e opta por não pagar”.
“Sabemos que o Banco de Moçambique andou a comprar dólares disponíveis do mercado e que o Governo poderia ter-se sentido inclinado em honrar o compromisso. Só que isso iria implicar tratar de forma mais severa e séria as despesas internas e as reformas. Claramente, o Governo não quer ir por aí, pelos elevados riscos políticos e sociais que tal opção implicaria. Simultaneamente, ao faltar ao compromisso coloca pressão sobre os credores para avançar para a renegociação, mas a sua margem de manobra parece limitada, principalmente se os casos em investigação criminal forem mais grave do que se sabe”, acrescentou Francisco em entrevista por correio electrónico.
O nosso entrevistado, que é também director de investigação e coordenador do Grupo de Investigação sobre a Pobreza e Protecção Social do Instituto de Estudos Sociais e Económicos (IESE)”, disse no entanto que “a implicação imediata que me parece inevitável é o agravamento da já bastante má reputação de Moçambique, com implicações para as futuras os créditos comerciais, os juros e condições de pagamento de futuros empréstimos, taxas de cartões de crédito internacional, entre outros aspectos. Moçambique já está em default/incumprimento selectivo. Este incumprimento consolida a possibilidade de falência, principalmente sabendo que as prestações maiores ainda estão para vir”.
De acordo com o académico moçambicano, “nos meses passados o Banco de Moçambique limpou ligeiramente e começou a colocar algum controle no sistema bancário, o que poderá ter contribuído para um certo susto inicial, mas também uma tranquilidade e reforço da confiança nos bancos existentes, visto que os bancos afectados (sobretudo o liquidado) deixa muito a desejar. Vamos ver se este incumprimento não retoma a desvalorização, de algum modo estancada. Como também o investimento está parado, as importações reduziram e não existem perspectivas para retomarem, neste semestre. Para além disso, nada de relevante existiu, com a agravante que o Governo continua a dizer que quer viabilizar as três empresas envolvidas na dívidas oculta, mas nada de concreto e positivo tem mostrado que justifique ser tomado a sério”.
“Outra implicação é que o não pagamento desta prestação permite ao Governo aliviar a pressão sobre o sistema interno, reduzir a urgência das reformas públicas que é preciso realizar. Isto é bom? Se for para adiar ou evitar reformas acho mau. Mas seria bom, se fosse para dar folgo e evitar que tenha que fazer mudanças sob pressão e de forma desorganizada”, concluiu o Professor António Francisco.
É interessante ainda notar que o Executivo de Filipe Nyusi preferiu injectar mais de 100 milhões de dólares norte-americanos para evitar a falência do Moza Banco, em finais de 2016, e tenha optado dar um calote de pouco mais de 59,7 milhões de dólares aos credores dos primeiros Títulos que Moçambique emitiu no mercado internacional.
Na verdade, se é para “nos mantermos firmes e unidos perante as adversidades”, porque razão o Presidente Filipe Nyusi não rompe com o passado e renuncia as Garantias dadas pelo Governo de Armando Guebuza para os empréstimos da Proindicus e da MAM e deixa o seu antecessor, assim como os seus acólitos pagarem as dívidas que contraíram violando a Lei Orçamental e a Constituição da República, como foi já constatado pelo Tribunal Administrativo e pela Comissão Parlamentar que investigou as dívidas?
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