Economistas do Instituto de Estudos Sociais e Económicos(IESE) rebatem a tese do Governo de Filipe Nyusi de que a crise económica e financeira que estamos a viver deve-se ao excesso de consumo dos moçambicanos relativamente a nossa capacidade de produção. O excesso de consumo não é de todos os cidadãos mas de “grupos sociais específicos, as oligarquias nacionais e as corporações internacionais” argumentam Carlos Castel-Branco, Fernanda Massarongo, Rosimina Ali, Oksana Mandlate, Nelsa Massingue e Carlos Muianga que concluem em que Moçambique “precisamos de um governo que se demarque claramente, e com acções, da irresponsabilidade financeira do anterior executivo”.
Os nossos governantes não se cansam de repetir que vivemos um “momento atípico” e que a crise que enfrentamos, há mais de um ano, deve-se à conjuntura externa, à suspensão da ajuda dos doadores e até ao clima. Porém economistas do IESE afirmam, no mais recente boletim IDeIAS, que as raízes da crise são “classicamente típicas e representativas das dinâmicas da economia extractiva, afunilada e porosa, e têm sido discutidos em Moçambique desde o início deste século”.
Recordam que “em 1992, ano em que terminou a guerra dos 16 anos, a taxa de cobertura das importações pelas exportações, excluindo mega projectos, era de cerca de 30%, sensivelmente o mesmo valor que em 2014. Este problema foi identificado há década e meia e tem sido discutido em inúmeras ocasiões. Não é novo nem atípico”.
“Entre 1992 e 2014, as exportações foram concentrando-se no complexo mineral-energético (72% do total das exportações) e em quatro produtos agroindustriais em estado primário ou semi primário de processamento (madeira, açúcar, banana e tabaco, 18% do total das exportações). Assim, o impacto das flutuações dos preços das matérias-primas e outros produtos primários, principais exportações de Moçambique, deve-se não apenas à magnitude e volatilidade dessas flutuações, mas, sobretudo, à excessiva exposição e vulnerabilidade em que a economia moçambicana se encontra, devido à sua excessiva especialização, por opção de desenvolvimento, num núcleo extractivo (complexo mineral-energético e mercadorias primárias e semi-primárias para exportação)”, referem os economistas.
“Este afunilamento da base produtiva, fiscal, comercial e de emprego começou a agravar-se há três décadas, tendo acelerado na última década. Além disso, na década de 2005-2014, as importações cresceram muito rapidamente por causa da aceleração do investimento em mega projectos, da importação de equipamento militar e bens duráveis de luxo e da extrema dependência que a produção e o consumo têm de importações. Estes problemas, que estão em discussão pública há década e meia, são parte orgânica do modelo económico e, no seu conjunto, explicam a baixa taxa de cobertura das importações pelas exportações da economia. Portanto, não são novos nem atípicos”, concluem os investigadores do IESE na publicação que estamos a citar.
“Elaborar uma estratégia de reestruturação e desenvolvimento alternativa ao monetarismo do FMI”
Para Carlos Castel-Branco, Fernanda Massarongo, Rosimina Ali, Oksana Mandlate, Nelsa Massingue e Carlos Muianga constataram no discurso dos governantes que 60% da Dívida Pública de Moçambique “foi para construção de infraestruturas de grande porte, associadas a mega projectos, e um sexto da dívida são avales do governo para dívida privada ilegalmente assumida pelo anterior executivo”.
“Portanto, mais de 75% da dívida foi para financiar a acumulação privada de capital e não para o consumo dos cidadãos ou do Estado. Se há excesso de consumo, quem consome em excesso?”
A explicação é que “Não é a economia como um todo, nem os cidadãos comuns ou o Estado. São grupos sociais específicos, as oligarquias nacionais e as corporações internacionais, quem o faz, em resposta aos padrões de produção e de distribuição da economia moçambicana. Portanto, a dívida não resulta de consumo em excesso de todos os cidadãos e do Estado, mas da expropriação do Estado, por via do endividamento, para financiar oligarquias nacionais e internacionais”.
Para os economistas moçambicanos, “Se o grosso da dívida foi gerado pelo investimento em infraestruturas que não servem a economia como um todo, então é sobre esse tipo de “consumo” que a austeridade deve recair, revendo, reestruturando e realocando o investimento público para priorizar a diversificação, alagamento e articulação da base produtiva, comercial, fiscal e do emprego”.
Mais do que as tentativas de ignorar os reais problemas e de ocultar a verdade os investigadores do Instituto de Estudos Sociais e Económicos, apelidados de “apóstolos da desgraça” quando previram a crise da Dívida Púbica aproximar-se, recomendam que é preciso “contextualizar a questão da dívida, de entender a sua estrutura e dinâmicas e de elaborar uma estratégia de reestruturação e desenvolvimento alternativa ao monetarismo do FMI e à ganância especulativa da banca, das multinacionais e das oligarquias nacionais, e precisamos de um governo que se demarque claramente, e com acções, da irresponsabilidade financeira do anterior executivo”.
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