O baixos salário – “apontado como sendo uma das causas da insatisfação no ensino primário e secundário em Moçambique” – as turmas numerosas, os obstáculos na nomeação e mudança de categoria e de escalão, as precárias condições das infra-estruturas escolares, a ausência de valorização da profissão pela sociedade e a falta de residências condignas são alguns desencantos – diga-se, em abono à verdade, já há longos anos conhecidos – dos professores do ensino público, que no entanto assumem que, pese embora não estejam satisfeitos com o seu trabalho, gostam dele e “poucos trocariam a profissão por outra, se houvesse oportunidade para fazê-lo”. Quem o diz é o próprio Ministério da Educação e Desenvolvimento Humano (MINEDH), num relatório intitulado “Estudo Holístico da Situação do Professor em Moçambique”, divulgado semana finda, em Maputo.
A pesquisa apurou que, de uma forma geral, todos os professores exercem a sua profissão por vontade própria e gostam dela e “tendem a não querer mudar de profissão, apesar da sua insatisfação com o salário e dos problemas de gestão de recursos humanos, que dificultam a sua nomeação e mudança de categoria e de escalão”.
A insatisfação dos docentes com a sua profissão deve-se ao baixo salário, às condições de trabalho (turmas numerosas), à demora na tramitação dos processos para a mudança de carreira, ao atraso no processamento das horas extras, à falta de promoções por tempo de serviço e à falta de prestígio da profissão na sociedade.
No que tange ao salário, a maioria dos professores entrevistado (75.7%) afirmou que não está satisfeita com o vencimento que aufere e 78.4% dos docentes não conseguem fazer face ao custo de vida com o ordenado que recebem.
Do mesmo grupo, 70.5% disseram que que o que aufere – em data não fixas mas é sempre no fim do mês – não corresponde ao trabalho que realizam e outros inqueridos (80.5%) garantiram que resposta “o salário definido para a sua categoria não é satisfatório”.
“47.4% afirmaram que o salário não tem sido pago no período previsto nos dispositivos normativos. Em relação a este último aspecto, note-se, contudo, que uma parte relevante dos inquiridos (40.8%) mostra que, ao contrário dos outros, o salário chega no tempo previsto. Os professores das carreiras de N4 e N5 auferem salários mais baixos, não usufruindo do regime especial de salários”.
Todavia, eles dizem-se satisfeitos com as actividades que o MINEDH desenvolve. Alguns docentes mais antigos, de acordo com o estudo, dizem haver, actualmente, melhorias consideráveis em relação ao passado. “Contudo, outros professores referiram-se à necessidade de incentivos, tais como, residências condignas para os professores, particularmente nas zonas suburbanas; subsídio de risco; aumento do salário, melhoramento de infra-estruturas, revisão do rácio alunos-professor, compatibilização da carga horária com os temas programáticos, e revisão das passagens semiautomáticas (ciclos de aprendizagem)”.
A pesquisa, de 156 páginas, constatou ainda que 62,2% dos professores mostram-se insatisfeitos com relação à categoria e ao escalão a que se encontram enquadrados. Apesar destas insatisfações, 70,9% dos inquiridos tiveram nomeação; mais do que a metade (50,9%) é que conhece os procedimentos de mudança de categoria; e ainda cerca da metade tem conhecimento da existência de um mecanismo eficaz de aviso, quando o salário é depositado nas suas contas.
“Julgamos merecer uma reflexão o facto de metade dos inquiridos desconhecer os procedimentos para a mudança de categoria, bem como o facto de não receber qualquer aviso quando o salário é transferido para as contas dos professores. Na carreira profissional, os professores de nível mais baixo para o nível mais alto levam muitos anos a progredir (+ de 30 anos). De uma forma geral, os professores que participaram neste estudo não estão satisfeitos com a profissão que desde cedo abraçaram”, indica.
A dado momento, os pesquisadores revelam ter apurado que o salário dos docentes é baixo comparativamente aos de outros profissionais com o mesmo nível académico e não é suficiente para o actual nível do desenvolvimento da sociedade, não cobrindo, deste modo, as despesas do dia-a-dia. Por exemplo, “o baixo salário contribui para que os professores não tenham boas condições de vida, em termos de habitação, alimentação e transporte”...
Condições de trabalho deficitárias
Os professores disseram que fazem um esforço adicional para acompanhar as actividades de todos os alunos na sala de aula. Por um lado, são muitos alunos numa sala e, por outro, existem alguns alunos com necessidades educativas especiais, o que aumenta, em grande medida, o grau de dificuldades no acompanhamento de todos os alunos durante o processo de ensino-aprendizagem. Os professores não estão preparados para trabalhar com turmas numerosas e muito menos com alunos com necessidades educativas especiais, assevera o estudo.
E dependendo da localização das escolas, eles “encontram inúmeras dificuldades para o desenvolvimento do processo de ensino e aprendizagem na sala de aula, pois nem todas as escolas têm quadro e giz, nem todos os alunos estudam nas salas de aula e com carteiras e, por fim, o livro de aluno que é de distribuição gratuita nem sempre chega para todos os alunos”.
Num outro desenvolvimento, indica-se que uma das grandes reclamações dos professores tem a ver com o facto de, no país, se privilegiar mais o grau académico em detrimento da experiência profissional, o que faz com que muitos professores por via individual ingressam nas instituições do ensino superior com o intuito de aumentar o salário.
Finalizado o curso, eles têm de formalizar a sua documentação a fim de serem promovidos para mudar de uma carreira para outra. Porém, os professores que estudam por iniciativa própria não estão abrangidos pelo sistema de bolsas do MINED, “resultando daí o não reconhecimento oficial do MINED da continuação de estudos. Consequentemente, surge o problema de provimento ou integração, devido à falta de cabimento orçamental, entravando a progressão dos professores”.
Os professores afirmaram existir falta de clareza no pagamento do segundo turno, visto que, na segunda turma, o professor faz o mesmo trabalho que na primeira turma, indica o estudo.
Face a este mar de queixas, os investigadores sugerem a tomada de medidas no sentido de melhorar as condições e a vida do professores, e indicam que tal “é imprescindível para o alcance da educação para todos e para a melhoria da qualidade de ensino” no país.
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