A descoberta das dívidas ilegais da Proindicus, EMATUM e MAM “foram o melhor trambolhão que podia ter acontecido a Moçambique nos últimos anos” defendeu o Professor Catedrático em Economia da Universidade Eduardo Mondlane (UEM), António Francisco, argumentando tratar-se de uma evidência da desorçamentação “consciente e racional” que os sucessivos governos do partido Frelimo vêm efectuando há duas décadas às Contas do Estado. O mais recente saldo do caixa governamental é de 63,5 biliões de meticais, uma espécie de “saco azul” gerido à margem do Orçamento de Estado.
Pelo menos desde 1999 o Executivo tem retirado do Orçamento de Estado (OE) biliões de meticais que em vez de serem geridos através da Conta Única do Tesouro (CUT), como dita a alínea a) do n.º 1 do artigo 54 da Lei n.º 9/2002, de 12 de Fevereiro, que cria o Sistema de Administração Financeira do Estado, são movimentados através de várias contas domiciliadas em bancos comerciais sem a fiscalização obrigatória da Assembleia da República assim como do Tribunal Administrativo(TA).
Nessas contas em bancos comerciais, e ignorando de forma reiterada as recomendação que o TA tem feito desde 2014, “é na CUT que devem estar centralizadas as receitas arrecadadas, tanto internas como externas, bem como o pagamento das despesas públicas, independentemente da sua natureza”, existiam a 31 de Dezembro de 2017 mais de 63,4 biliões de meticais, valor que corresponde a cerca de 80 por cento de todo o défice do OE e que seria mais do suficiente para suprir o défice existente para a realização das Eleições Gerais, garantir a importação de medicamentos durante mais do que 2 anos, construir hospitais, escolas e quiçá iniciar a reabilitação da destruída cidade da Beira.
Aliás entre 2016 e 2017 o Executivo de Filipe Nyusi gastou 9,8 biliões de meticais desses fundos sem que nenhum justificativo tenha sido fornecido ao Tribunal Administrativa.
O Professor António Francisco, que tem acompanhado e estudado a evolução destes fundos que sucessivos governo do partido Frelimo mantêm à margem do OE, constatou durante uma apresentação que efectuou recentemente na Univerisade Católica em Pemba que apesar de crise económica que Moçambique mergulhou desde 2016: “Nunca antes de Nyusi os cofres estiveram tão cheios!”.
As Receitas internas tem aumentado, a arrecadação de impostos também tem crescido paralelamente com a expansão das Despesas públicas (os salários públicos são os mais altos do mundo em relação ao Produto Interno Bruto) e o aumento da corrupção.
“Em vez de consolidação fiscal, no sentido de mais rigor, temos a indisciplina orçamental consentida e tolerada”
Das análises do académico moçambicano, que também é investigador no Instituto de Estudos Sociais e Económicos (IESE), têm realizados os cinco tipos de Desorçamentação: “Criação de organismos regidos pelo regime de autonomia administrativa e financeira sem que para tal reúnam os requisitos exigidos por lei; Criação de sociedades anónimas de capitais exclusivamente públicos (Sector Empresarial do Estado); Criação de entidades regidas pelo direito privado, como sejam fundações, fundos, institutos, entre outras, que do ponto de vista financeiro e fiscal são equiparadas a entidades do sector público administrativo; Transferência de avultados recursos orçamentais para fora do perímetro do OE, alegadamente para financiar Outras Instituições do Estado, mas na prática, para “escapar” ou ludibriar os princípios de prudente gestão macroeconómica e boa regulação da economia e da concorrência; As consequências da espécie de diarquia funcional (ou dualidade de gestão dos recursos) decorrente da opção dos doadores por procedimentos extra-orçamentais (off-budget)”.
Na seu Parecer Sobre a Conta Geral do Estado de 2017 o Tribunal Administrativo observa o incumprimento reiterado das suas recomendações “subsistindo a urgente necessidade de tomada de medidas concretas para a melhoraria do Sistema de Controlo Interno”.
Desde 2014 que o Tribunal que fiscaliza o Estado não tem conseguido “apurar o saldo da CUT em Meticais, por falta de disponibilização da informação, o que não permitiu a emissão da opinião, quanto à fiabilidade do saldo desta conta, constante do Mapa I.”
“Falta de observância do dever de devolução de saldos de adiantamento de fundos à CUT, conforme as Circulares de Encerramento do Exercício emanadas anualmente pelo Ministro das Finanças”, notou o TA que indica que “Parte significativa dos saldos de caixa permanece nas Outras Contas do Estado e nas Recebedorias, ao envés da CUT” e constatou que tem havido inconsistências “entre o valor apresentado no Mapa I da CGE de 2017, na rubrica Outras Instituições do Estado e o calculado com base nos Anexos Informativos 1, 2 e 3.”
Para o Professor Catedrático da UEM as constatações e recomendação do Tribunal Administrativo, que são literalmente ignoradas pelo Executivo, evidenciam que em “em vez de consolidação fiscal, no sentido de mais rigor, temos a indisciplina orçamental consentida e tolerada”.
Ministro Maleiane garante Governo não vai abandonar a Proindicus, EMATUM e MAM
Um dos exemplos mais evidentes são as empresas Proindicus, EMATUM e MAM que claramente foram criadas à medida do processo de desorçamentação com a agravante que para obterem fundos a serem desviados foram endividar-se à banca internacional com Garantias do Estado ilegais.
A Auditoria realizada pela Kroll identificou vários exemplos de potenciais violações de deveres fiduciários pelos Directores das Empresas “o que parece ter resultado em que contratos de empréstimo e de fornecimento fossem acordados de forma onerosa”, “A Kroll não conseguiu obter registos contabilísticos fiáveis das Empresas de Moçambique para permitir a devida avaliação da posição financeira de cada empresa”, “o trabalho da Kroll não identificou um Plano de Actividade coerente para trazer os bens das Empresas de Moçambique ao estatuto operacional, o que lhes permitiria gerar receitas num futuro próximo”, só para citar alguns casos típicos de desorçamentação deliberada.
Paradoxalmente, e apesar de todas evidências de má gestão, corrupção e falência, o ministro Adriano Maleiane disse no passado dia 15, na Plenária da Assembleia da República, que o Governo não está alheio as empresas Proindicus, EMATUM e MAM, “nós não estamos a abandona-las”.
“Nós estamos num processo de reestruturação de todo o sector empresarial do Estado e naturalmente se estas empresas reunirem a as condições para serem consideradas empresas do Estado nós vamos ter que reestruturar e significa: ou liquidamos ou privatizamos”, afirmou o ministro da Economia e Finanças na plenária da Assembleia da República.
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