Como uma nota introdutória que nada pretende introduzir, permitam-me caros leitores advertir antes de mais que, o presente artigo não constitui e nem pretende ser um material científico ou informativo com o rigor técnico, metodológico e epistemológico exigido. É na maior das miragens, uma simples retrospectiva e manifestação de desagrado de um Moçambicano que como os outros milhões, vai sentindo a dor e o sofrimento dos irmãos da Beira, agudizado pela ambição imensurável de alguns servidores do “povo” que sem se preocuparem com os meios, lutam para alcançarem os seus objectivos, enriquecer.
Importa realçar que, em Moçambique, apesar de não existirem dados exactos concernentes à quantificação das vítimas do ciclone IDAE que encontram-se nos centros de abrigo, estima-se que estejam naqueles locais, cerca de 843.723 pessoas, se fizermos uma relação directa com o número de pessoas afectadas (dados do Diário de Noticias, 31/03/2-19). Na verdade, esses números, ainda que sejam matematicamente elevados, ganham contornos mais assustadores e até certo ponto, mais profundos, se vistos numa perspectiva humanitária. Portanto, a referência a estes números deve mexer com a sensibilidade emocional e solidária de qualquer ser humano, pois, são vítimas humanas que entre elas encontramos pessoas de todas as faixas etárias, religiões, sexos, etc.
Por causa disso mesmo, muitos estados, pessoas singulares, organizações etc., solidarizaram-se com Moçambique e sobretudo com as vítimas do IDAE, que sem tardar, começaram a canalizar apoios de diversa natureza, para o resgate das vítimas do ciclone. Findo esse exercício, do qual é importante sublinhar o facto de ter sido muito questionado pela imprensa internacional, dada existência em Moçambique, de uma força marinha sem barcos, mesmo sendo um país costeiro; agudizou-se o desafio da gestão deste processo, fundamentalmente dos centros de abrigo da Beira e os mecanismos de distribuição, administração e controle dos donativos.
Ao que se testemunhou pelos diferentes meios de vinculação de informação, os Moçambicanos não ficaram indiferentes à causa, foram levadas a cabo campanhas para a angariação de fundos e donativos para as vitimas, notou-se e ainda nota-se, uma consciência solidária, identitária e união das diferentes camadas sociais em prol de uma causa, ajudar as vítimas. Entretanto, apesar das notáveis quantidades de donativos, tanto em produtos, assim como em dinheiro, as vítimas continuavam a reclamar de fome, falta de abrigo, água etc., o que começou a levantar suspeitas sobre prováveis desvios dos donativos. Mas quem poderia pensar nessa possibilidade?
Sobre este assunto, a Euronews fez nos saber que: “(…) perante a devastação provocada pela passagem do ciclone IDAI, o mundo uniu-se para ajudar Moçambique. Além dos donativos em dinheiro, os aviões com bens de primeira necessidade, água e medicamentos já há mais de uma semana começaram a chegar ao país, sobretudo à região da Beira, a mais afectada pela tempestade tropical (…) e sublinha que por fim, que (…) a ajuda que não tem chegado toda aos destinatários (…)”. Em reacção a esta situação, as autoridades moçambicanas admitiram que existência casos de roubo de alimentos e donativos. E como de habitual, “celebrou-se a missa” da promessa de fazer uma fiscalização apertada e punição exemplar para os criminosos.
Passados alguns dias, o jornal Lusa deu a conhecer que as autoridades moçambicanas detiveram três pessoas suspeitas de desvio de donativos que deviam ser canalizados para as populações afectadas pelo ciclone IDAI. Podendo se ler ainda na mesma fonte, que os três indiciados são suspeitos do desvio de 19 sacos de arroz, 19 sacos de farinha, 11 sacos de soja e um saco de feijão no bairro da Manga, na Beira.
Com isso, o que para muitos Moçambicanos que não mediram esforços para ajudar os seus irmãos, podia ser uma acusação descabida e de dimensão abismal, mostrava-se ser uma verdade que vinha-lhes aos olhos através de factos, reportagens a nível nacional e internacional. E como contra factos não se pode argumentar, o PR da república ordenou em reacção a estes escândalos, a criação de uma comissão para a investigação dos desvios. Por sua vez, o porta-voz da PRM-Beira, Joaquim Tomo, acredita que deve ser a população a denunciar casos de desvios, uma ideia pouco pensada se considerarmos que os donativos não chegam aos centros por causa deste mesmo problema (desvios). Ou seja, o desvio, muito provavelmente aconteça antes de chegar, com excepção de alguns possíveis casos de roubos por terceiros no local. Com isso, pretende nos parecer que os desvios mais preocupantes não possam ser/não tenham sido feitos na base. Importa realçar que, a prisão destes pode ser resultado de uma acção/roubo independente (sem o comando dos superiores) pois, pelo nível de reclamações, pode-se concluir sem muita dificuldade, que os desvios tem sido feitos por indivíduos com algum poder no seio do grupo responsável pela gestão destes donativos.
Mas afinal, de que crime os infractores serão/são acusados? Desviar produtos e ou fundos que deveriam ser canalizados para o sustento de um grupo cuja sobrevivência depende unicamente desses mesmos donativos, não deve ser visto como um simples desvio ou roubo, é muito mais grave que isso, esse grupo pode morrer a fome. Na verdade, o desvio de donativos deve ser visto numa dimensão e perspectiva muito mais profunda do que um simples acto de roubo, é uma tentativa (in)consciente de assassinatos em massa. Aliás, esses actos podem resultar em mortes massivas por fome.
Os moçambicanos precisam tomar uma posição sobre este assunto, exigirem esclarecimentos, responsabilização e devolução do que foi desviado. É uma questão de consciência colectiva e solidária, sentirmos que Moçambique é um só e a dor deve ser de todos nós, não pode ser a desgraça dos outros, uma oportunidade para alguns.
Que venham dias melhores para Moçambique!
Por Dercio Carlos Alberto
via @Verdade - Últimas http://bit.ly/2Zfk7OE
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